O parto - parte final
Como vos contei aqui, não havia anestesistas.
Passaram 45 minutos, e eu já não me aguentava de pé, as dores tornaram-se mais fortes. Iam passando profissionais: não nos esquecemos de si. Comecei a arrepender-me de não ter ido para o privado. Não me estava a imaginar aguentar muito mais daquilo e ainda as dores de expulsão.
Nos meus limites chamei, então a anestesista? O meu medo começou a ser: passar a janela de anestesia e ter de sofrer tudo. Volto a chamar, está quase dizem eles. Por milagre chega a anestesista. Ufa, que vi a minha vida a andar para trás.
Vamos lá, e agora? Agora não me consigo sentar, que é a posição em que prefere administrar. Lá me deito e consegue, não me doeu e foi rápido, tinha imaginado muito pior.
Que alívio, não aguentaria muito mais, passei a sentir a contracção, sem dor.
(O mais curioso: a tal mãe que já tinha dois filhos e foi prioridade, teve o bebé depois de mim...)
Achava que estava perto do parto, mas a dilatação ainda estava tímida e o que tinha sentido em casa não tinha sido a ruptura de bolsa, tiveram de o fazer mecanicamente. Seguiram-se muitas horas de trabalho de parto latente, em monitorização constante. Cada vez que sentia uma contracção, o batimento dele abrandava e causava-me pânico.
Às cinco da manhã comecei a ficar com medo, está a demorar muito, detestava sentir o batimento dele a abrandar, comecei a arrepender-me de não ter optado por cesariana. Ainda tinha muito medo que corresse mal.
Sete da manhã: nada. Passado pouco tempo sinto-me mal: quase a desmaiar mesmo deitada. Chamo por enfermeira: a dilatação tinha completado, era agora que começava o trabalho de parto a sério. Veio a médica com dois internos saber a minha história, foi a última vez que repeti toda a barbárie que sofri. Teve duas reacções: uma empatia que foi importante, assegurou-me que ia correr bem e pelo discurso disse logo aos alunos que estavam a falar com alguém ligado à ciência.
Começaram com os preparativos, e entra pela sala ela e mais uns cinco internos, foi um bocadinho demais, hospital-escola a quanto obrigas. Explicou muito bem o processo e o que deveria fazer e como.
Estávamos na hora H.
Puxei uma primeira vez, muito bem. Uma segunda, ela passou para o meu lado e chamou a neonatologista. Entrei em pânico total, que tonta fui, todos têm de ser vistos pela neo, mas nesse momento toda eu era medos. Antes da terceira o médico que estava a fazer o parto pediu ventosa, ela fez um pouco de força na minha barriga, puxei. Foi uma cena de filme, ela disse que era agora, puxei mais e dei um berro de esforço, tipo ténis sei lá, e foi nesse momento. Saiu, no espaço que me pareceram horas para ele chorar, continuei em pânico. Chorou. Só o conseguia seguir com os olhos, onde estava o que lhe estavam a fazer. Não via mais nada. Acalmei quando me disseram à terceira que estava tudo bem. Foi aí que olhei para ele: chorava, até soluçava. Eu não consegui chorar, estava demasiado atenta ao meu filho, estava assoberbada de sentimentos, não sei explicar. MAs foi lindo vê-lo tão emocionado. Os médicos falavam para ele mas nem conseguia responder. Estivemos de mão dada o tempo todo, só me dizia: és tão linda, correu tão bem, foi tão lindo, portaste-te tão bem. Enquanto me davam os pontos, vim a mim. Perguntei o apgar, 9 no primeiro minuto e depois 10: perfeito. Os médicos comentam que é lindo, e diz me o principal: é mesmo lindo e olhe que não costumo dizer. Os outros concordam com a cabeça. Colocaram-no comigo, primeiro a fazer pele com pele, num momento que me transcendeu, depois para mamar. Uma pega perfeita à primeira, esteve meia hora ou mais a mamar. Senti plenitude nesse momento, nada mais importava. Só mais tarde entendi, mesmo com ventosa ficou com a cabeça perfeita passado pouco tempo, foi o mínimo, só mesmo para ajudar, acredito que a minha história tenha levado a médica a ser mais cuidadosa. Ficou muito pouco inchado depois do parto, só depois de ver vários recém nascidos com 15 dias e até um mês percebi.
Nasceu mesmo lindo, perfeito e com carinha de rapaz logo no dia a seguir. Desde então somos uma família, tão mas tão feliz.